quinta-feira, 31 de julho de 2008

Rotina médica

Fui a uma médica hoje, para acompanhamento. Levei os exames desde sempre e ela analisou cuidadosamente um a um. 

Ficou bem impressionada com o estado geral e os números específicos (CD4 e carga viral), mas me pediu para tomar uma bateria de vacinas (tétano, hepatite A, gripe....).

Viu a doideira do exame negativo que tive 1 mês após o primeiro exame positivo e comentou: «isso é só para pirar a gente, né?»

Fez aquelas perguntas de sempre sobre drogas e sexo com proteção, quando perguntou se eu usava camisinha e ela mesma falou «não, né...?» e eu falei «sempre, sempre me protegi muito.»

«Ué, mas como....»

Aí contei a ela como aconteceu e meus olhos se encheram de lágrimas. Vi que os olhos dela também, ela ainda apoiou a testa na mão enquanto escrevia, mas seus olhos ficaram avermelhados e ela fez algum comentário do tipo «que coisa, né...?

Essa empatia faz uma diferença brutal para quem vai ao médico lidar com assuntos tão duros.

Num exame antigo que eu folheei, ainda da época pré-hiv, vi o resultado «não reagente» e meu coração palpitou fortemente, cheguei a ficar meio tonto...

Mas, como ela disse, a batalha está aí, vamos enfrentá-la!

Pesadelo

Uma amiga (que sabe do meu status) virou para mim e disse: «Você está com hiv!!» e nisso apareceu flutuando no ar «Hiv» «hiV» «HiV»  em letras amarelas.

Meu desespero foi enorme. Acordei ofegante, o coração disparado, o corpo tenso... «Ufa! Foi só um pesadelo..»

Foi?

terça-feira, 29 de julho de 2008


Esse outdoor foi criado por um estudante de Wisconsin, vencedor da segunda
rodada do concurso “What If It Were You?”.

E a luta contra o preconceito continua...
Hoje fui fazer uma consulta de rotina com uma dentista.

O comentário dela: "Dentes bem cuidados, escovação excelente, você está de parabéns..."

Que ironia... sempre cuidei muito da minha saúde. A primeira vez que tive uma doença venérea, foi logo que conheci uma namorada minha: uma secreção no pênis, que não foi diagnosticada mas que se resolveu com um antibiótico em dose única.

Na segunda vez, eu senti uma aspereza na mucosa anal e um amigo dermatologista me examinou e ficou impressionado, como eu senti microverrugas de hpv, a maioria dos pacientes chega com um quadro bem mais avançado. Eu fiquei péssimo e ele disse que não era para me apavorar, não significava que eu tivesse me exposto demais nem era razão para eu me preocupar... Como eu sempre me protegi muito, fiquei muito chateado com aquilo e fiz o tratamento com proctologista, me livrando das verrugas bem mais rápido do que o previsto.

Mas como a vida prega peças, acabei me descobrindo, anos depois, hiv+. Desde então, mantive todos os cuidados e redobrei a atenção.

Há uns dois meses, tive um pequeno episódio de herpes no pênis. Putaquiupariu! Nunca havia tido herpes na vida, tinha que surgir agora? Tenho me comportado como uma freira comportada (há as que não se comportam...) e ainda me aparece isso? Entrei em pânico, com medo de ser sinais da "doença". Consegui limpar a área rapidamente sem aciclovir nem nenhum outro remédio para herpes, somente usei um fitoerápico pernambucano e gel de aloe vera da Forever Living.
Há umas duas semanas, novas vesículas começaram a surgir, para o meu terror... Conversando com um amigo médico, não é nada para me preocupar, meu corpo está reagindo e criando os anticorpos.

Superando a neura, não posso deixar de pensar o quanto que sofro com o medo de desenvolver a "doença" e enfrentar quadros duros de se controlar.

Outro dia, recebi um email de um site internacional de relacionamentos para hiv+. Era o contato de um cara de São Paulo de 25 anos. Como nem lembrava desse perfil nesse site, nem estou à procura de relacionamento, demorei a responder (tive que recuperar a senha) e logo eliminei o perfil do tal site. Conversamos brevemente sobre hiv etc. Ele descobriu ser soropositivo e começou a tomar o coquetel em seguida. Teve uma reação brutal, precisou de 40 dias de licença para contornar os efeitos, incluindo manchas vermelho-sangue por todo o corpo. Para piorar, após algum tempo, sua carga viral voltou a aumentar e a medicação teve que ser trocada. Com a nova medicação, tudo funcionando bem!

Caramba, trocar experiências com outros hiv+ é incrível, mas confesso que fiquei muito apavorado... acho que me nego ao máximo encarar o que vem pela frente...

Coisa boa: ele me recomendou uma infectologista aqui em Sampa. Devo ir depois de amanhã, depois eu conto.

terça-feira, 22 de julho de 2008

ELEVEN THINGS I HAVE LEARNED FROM
LIVING WITH HIV FOR OVER 20 YEARS

by
Dennis de Leon

1. BE THE BEST INFORMED PERSON YOU KNOW ABOUT MEDICAL TREATMENTS. EVERY YEAR, DOUBLE YOUR KNOWLEDGE ABOUT THE DISEASE, HOW IT GROWS AND HOW IT CAN BE DEFEATED.

2. BE AGGRESSIVELY INVOLVED WITH CLINICAL TRIALS BECAUSE THEY OFFER THE REGULAR HEALTH MONITORING AND ACCESS TO NEW MEDICATIONS. DEVELOP THE ABILITY TO TELL WHEN YOU ARE GETTING A PLACEBO AND, IF YOU WANT, OPT OUT OF THE TRIAL.

3. LIVE LIKE YOU ARE GOING TO DIE TOMORROW. TRY THINGS YOU NEVER DREAMED OF AND STOP “RESUME BUILDING.” DO THINGS YOU ENJOY AND THAT PAY YOU SOMETHING FOR DOING IT. SO IF YOU DIE YOU WERE AT LEAST DOING WHAT YOU WANTED.

4. SEE THE BEAUTY OF THINGS AND PEOPLE AROUND YOU AND IF THEY DO NOT APPEAR BEAUTIFUL, WORK HARDER TO SEE THE BEAUTY IN THEM. WHY? BECAUSE BEAUTY CAN SUSTAIN YOU.

5. NEVER BECOME A “VICTIM” OR THE DESIGNATED PERSON WITH AIDS IN THE ROOM. YOU ARE MORE THAN THAT AND SHOULD NOT BE DEFINED BY A DISEASE. YOU ARE NOT A VIRUS SO DON’T ACT LIKE ONE.

6. MAKE YOUR FAMILY PROUD. MY WAY WAS TO GIVE THEM NEWS OF THINGS I ACCOMPLISHED, NEWS WITH MY NAME IN IT SO THEY CAN CIRCULATE THE WORD TO ALL THE EXTENDED FAMILY AND FRIENDS. GOD KNOWS I HAVE PUT THEM THROUGH GRIEF SO MUCH GROWING UP. THEY DESERVE AT LEAST A FEW BRAGGING POINTS. ALL THEY REALLY CARE ABOUT IS THAT YOU WERE VALUABLE AND VISIBLE TO OTHERS AND THAT IT REFLECTS WELL ON THEM.

7. DEVELOP AN ACTIVE SENSE OF OUTRAGE AND ENCOURAGE OTHERS TO DO SO. THIS IS SO CRITICAL. PEOPLE WILL THINK YOU ARE ASLEEP UNLESS YOU SHOUT BOO TO THE POWERS THAT BE AROUND YOU ONCE IN A WHILE. IF YOU ARE NOT OUTRAGED BY INJUSTICE THEY WILL BURY WITH INDIFFERENCE, BUREAUCRACY AND PITY BEFORE YOU ARE DEAD.

8. SPREAD LOVE WHERE EVER YOU GO. NO ONE LIKES YOU IF YOU ARE ANGRY OR REGRETFUL ALL THE TIME. KISS, HUG, REWARD, SURPRISE, AND DO ALL THESE AND MORE LOVING THINGS TO COMPLETE STRANGERS AND ACQUAINTANCES IN YOUR LIFE. FOR EXAMPLE, LOVE IS TO GET ON AN ELEVATOR AT THE FIRST FLOOR AND CONNECT WITH EVERYONE BEFORE YOU GET OFF AT YOUR FLOOR.

9. SEE THE CONNECTIONS. NEVER THINK YOU ARE THE ONLY ONE. YOUR NEW FAMILIES ARE PERSONS WHO BECAME INFECTED THROUGH DRUG USE, INDIGENT GAY MAN OR TRANSGENDERED PERSONS AND WOMEN WHO TRUSTED THEIR SEX PARTNERS. THE SHAME, PRIDE, PAIN, SCORN AND FIGHT FOR RESPECT OF ALL THESE GROUPS MUST BECOME YOURS BECAUSE YOU ARE PART OF THEIR WORLD.

10. DON’T FORGET SEX. IT FEELS GOOD AND CAN BE DONE SAFELY. DON’T STOP DOING IT EVEN WHEN YOU ARE LIVING WITH HIV/AIDS. IT’S AS MUCH A PART OF LIFE AS SPRING IS A SEASON.

11. IN ALL OF OUR STRUGGLES FOR FAIRNESS AND EQUALITY REMEMBER THIS: THERE ARE NO PERMANENT FRIENDS OR PERMANENT ENEMIES ONLY PEOPLE SHARING COMMON INTERESTS.

Via Regan's POZ Blog

terça-feira, 8 de julho de 2008

surpresas da vida

Hoje eu estava conversando pelo messenger com um ex-namorado francês. Desde que nos vimos pela última vez, há 5 anos, falamo-nos pouco, mas ficou sempre um carinho muito grande guardado e os contatos que tivemos por telefone e por email foram muito calorosos.
Conversamos um bocado sobre a vida, atualizando as novidades de cada um: onde estamos morando, o que temos feito etc.
Lá pelas tantas, falei para ele: você ainda não me falou TUDO sobre sua vida, pode contando os detalhes. Sei lá por que disse isso, mas queria saber mais mesmo da vida dele.
Ele levou um tempo para escrever e eu meio que pressentia o que ele estava prestes a me contar: terminou relacionamento, altos e baixos e recentemente descobriu ser hiv+.
Meu coração acelerou, eu levei um susto, pedi para ele parar tudo, respirei, perguntei como assim?, falei que estava impactado e que não acreditava no que ele estava me dizendo. Parecia que eu já imaginava isso, mas meu susto foi tão grande que ele me pediu desculpas por ter falado de maneira tão direta, que não havia outra forma de dizer tal coisa etc. Rapidamente eu falei que ele não precisava pedir desculpas e lhe falei de meu status. Aí o susto foi dele, que ainda perguntou por que eu nunca lhe dissera. Expliquei que não saio divulgando isso aos 4 ventos, que obviamente acabaria dizendo algum dia, mas pela distância e pelos contatos muito raros, não houve razão para que eu falasse. Ele entendeu e falou que ele também é muito reservado quanto ao status dele.
Daí pra frente, conversamos sobre o assunto, sobre a nova realidade, o medo da rejeição, os medos em geral. Foi engraçado, um tentando colocar o outro para cima, ajudando o outro a romper com seus próprios preconceitos e barreiras...
Uma coisa que ele falou que me tocou: há alguns meses lhe enviei uma foto minha que ficou muito boa. Ele recebeu e não teve coragem de responder, como se fosse um símbolo de uma outra vida que ele não poderia ter de novo. Foi mais ou menos na mesma época em que ele descobriu ser hiv+ e a minha foto era a lembrança de um outro tempo, de uma outra vida. Entendi perfeitamente, também sinto isso: um tempo em que tínhamos escolha, quando havia maior liberdade para viver as experiências.
Pensei nisso, no que significava essa "liberdade" -- que acabamos aproveitando mal (deixando de nos cuidar?), mas também por que essa liberdade havia acabado.
Afinal de contas, de onde vêm as barreiras que cerceiam essa "liberdade"? E mais: que liberdade é essa que acreditamos ter e que, pior!, acreditamos perder?
Na era do consumo, blá blá blá, hedonismo, blá blá blá, prazeres e relacionamentos descartáveis, blá blá blá, acreditamos que tudo pode ser usado e dispensado, como se as relações, as coisas, os afetos e até mesmo as pessoas fossem descartáveis, como se nós mesmos fôssemos recicláveis, autolimpantes. Uma experiência é apenas uma experiência, entra para um banco de dados e logo pulamos para o próximo registro. Sem qualquer moralismo (seria hipócrita de minha parte), usamos nossos corpos, afetos e relações de maneira irresponsável sim. A fidelidade conjugal está sendo relativizada até o limite, o sexo casual está se tornando uma prática corriqueira, os encontros e desencontros estão cada vez mais rápidos. O processo de se criar um relacionamento está truncado, as etapas de formação da intimidade estão invertidas e quando não dá certo (surpresa!) logo partimos para outra. Hoje o que eu mais ouço é: "ninguém quer nada sério", mas esse "ninguém" nunca inclui o declarante.
Quando falamos da perda da liberdade que acreditávamos ter, falamos de uma posição confortável, da qual se pode experimentar coisas e pessoas e sempre manter abertas muitas portas à nossa frente. Por conta dos estigmas da doença e de toda a rejeição a que estamos expostos, estas portas se fecham e saímos do nosso conforto.
Mas o engano começa antes mesmo de o hiv entrar em nossas vidas. Tal liberdade não existe. Simplesmente continuamos com os mesmos medos que sempre tivemos, com o agravante fator hiv+ que requer uma abordagem mais responsável e cuidadosa em relação a nós mesmos e ao outro. Mas essa responsabilidade e esse cuidado não deveriam estar condicionados ao status hiv.
Sério, consciente da necessidade de lutar contra toda carga de culpa, senti em muitos momentos que o hiv vem apenas me mostrar o que eu já deveria saber desde sempre: é preciso respeitar meu corpo, minha integridade física e emocional, a saúde dos meus relacionamentos; é preciso reconhecer o outro como digno do mesmo respeito e a relação que surge do encontro como algo quase sagrado do que há de mais belo entre dois seres humanos -- o potencial de se cultivar amor e criar uma nova realidade, uma nova vida. E o impacto desse amor sobre as outras pessoas.
Não somos tão livres se estamos presos a condicionamentos e instintos. Logo, não se pode perder o que não se tem. Liberdade é aprender a amar verdadeiramente a si mesmo e ao outro. Não há amor que não seja libertador. E esse amor, quando surge, não se limita por nada, nem mesmo por um vírus. Assim espero.
Uma história interessante e intrigante sobre a jornada de um homem até se descobrir soropositivo. Um pouco longa, mas vale a leitura: