Depois de algum tempo sem maiores novidades sobre o desenrolar de meu encontro com L. (veja o primeiro e o segundo posts a respeito), a mini-série finalmente chegou ao fim.
Continuamos em marcha lenta por todo esse tempo, veio carnaval, ele viajou a trabalho por 10 dias, enfim, um devagar e sempre bem xoxo. Mas eu também tinha minhas razões para querer seguir assim.
Primeiramente, ainda estou me recuperando de uma separação muito traumatizante, um relacionamento que era baseado na química sexual e só, mas que deixou sequelas um tanto profundas. Desta vez eu havia conhecido um cara com quem havia muitas afinidades e poderíamos acrescentar muito um ao outro, mas a química não era tão forte -- tá, falando bem francamente, não parecia haver química alguma mas nem tivemos tanta oportunidade de experimentá-la.
Segundamente, esse lance da química eu atribuo, pelo menos em parte, à minha dificuldade de lidar com o fato de ser hiv+ e estabelecer um espaço de intimidade tão rapidamente. Aquele dilema: conto logo de cara ou espero para ver se vale a pena contar? Se não fosse contar logo de cara, não poderia criar muita intimidade sem estabelecer limites muito claros para não expô-lo. Como estávamos em marcha lenta, não sabia se esperava algum momento certo, se é que haveria tal momento (na verdade houve, mas ele me interrompeu e pediu para não falar mais nada, o que foi um alívio para mim!).
Por outro lado, havia a questão da disponibilidade dele que, por ter um estilo de vida muito corrido, dividido entre duas cidades e com muitos problemas de trabalho, era um pouco difícil ter tempo para uma convivência mais próxima. Mas neste ponto eu volto à questão da química: se houvéssemos experimentado a intimidade mais profundamente e estabelecido uma ligação maior, talvez as faíscas poderiam ter acendido uma paixão mais intensa e esta disponibilidade teria sido criada.
Na verdade, entre saber se faltou entrega da minha parte ou se realmente não houve uma ligação maior por que realmente não havia a tal química, fico apenas com o que me cabe e aprendo a lição. Neste meio tempo, não deixei minha energia dispersar com outros caras, deixei de sair com outras pessoas para não comprometer ainda mais o processo que estava em andamento com L. Eu estava disposto a tentar fazer dar certo.
Então o que aconteceu foi o seguinte: na semana passada eu mandei uma mensagenzinha boba para ter notícias dele (nunca cobrei nem exigi nada dele mas também não sei como ele pode ter interpretado essa minha tranquilidade) e ele me ligou em seguida, falando que havia chegado na cidade na véspera, que havia vindo meio que de surpresa, decidiu num rompante para ir ao aniversário de uma grande amiga e tinha ido dormir bem tarde, mas que estava pensando em mim quando eu mandei o sms, incluindo um elogio parecido com «como sempre, você manda mensagens muito inteligentes». Eu quase ri, porque só faltava ele emendar e falar aqueles clichês todos de quem está dando um toco: «você é uma pessoa maravilhosa, você é incrível, por favor me entenda, o problema não é você, sou eu! Estou num momento em que preciso ficar comigo mesmo, estou com saudades de mim!» e blá blá blá... mas apenas marcamos um encontro para aquela noite mesmo.
Fomos ao teatro e depois jantamos com amigos dele. Tudo normal como sempre, nada de diferente nem fora do padrão, apenas uma discussão calorosa porém saudável sobre política antes de entrarmos na peça. Lá pelas tantas ele fez um comentário sobre sua rotina agitada que deu a entender que sua vinda havia sido planejada um pouco antes do que ele havia sugerido pelo telefone naquela manhã. Engoli em seco e deixei rolar.
Quando fui deixá-lo em casa, parei o carro e apenas disse «fala» e ele começou com algum rodeio, mas nem bateu a marca dos 10 segundos e desembuchou: «eu achei que estava num momento para ter uma relação mas pelo visto me enganei...». No afã de evitar a clichezada que se anunciava com um rufar de tambores ensurdecedor, fui um pouco mais incisivo «você não está disponível, L.» e ele «é isso, não estou disponível...» e eu falei «ok». Aí, ele meio que desbundou um pouco e falou «ok?» e eu falei «ok». Já havia digerido aquela coisa toda e não estava a fim de entrar em discusssões filosóficas nem falar nada que pudesse soar como uma defesa ou, pior, um contra-ataque.
Despedimo-nos com um selinho bem rápido, lhe desejei boa sorte com tudo e ele saiu de maneira meio desajeitada do carro, como se procurasse algo que não poderia esquecer ali, mas não havia nada e perguntei «você quer levar mais o quê?». Não foi minha intenção, mas ficou no ar um sentido dúbio para aquela pergunta. He... Antes de fechar a porta, ele ainda fez aquele movimento de colocar a cara para falar mais alguma coisa, mas recuou e se foi. Esperei 4 segundos para engatar a primeira e fui embora. Acho que batemos o recorde do toco mais rápido do mundo, sem drama nem enrolação.
Meu primeiro impulso foi tentar perceber se havia alguma dor naquele «rompimento». Mas aparentemente eu não estava sentindo nada em relação a ele, apenas lamentava o fato de não ter dado certo sem nem saber se o fracasso se deveu ao meu medo e minha postura defensiva. Por outro lado, um certo alívio por não ter revelado antes meu status sorológico porque se ele realmente não estava disponível, nada no mundo me tiraria da cabeça que ele teria pulado fora por causa disso. Um cigarro, eu só precisava de um cigarro. Porra, nem estava fumando, mas uma fumacinha ajudaria a sufocar um bocado fosse lá o que estivesse se passando comigo naquele momento -- dor? medo? alívio?
Obviamente, não sou tão ingênuo a ponto de comprar aquele papo todo, mas achei muito digno e delicado o modo como ele tratou a questão. É claro que ele realmente está num momento crítico da situação profissional e tudo mais, mas se a tal química estivesse ali bombando, tudo se organizaria para o tal momento de viver uma relação se materializar. Daí volto à questão de o quanto que minha posição mais retraída não impediu que a paixão surgisse, o quanto que meu medo não foi um peso morto para impedir que a relação deslanchasse? Ou não?
Como os relacionamentos em regra começam por um processo de apaixonamento intenso que cega e ilude as pessoas, trazendo aquela necessidade de estarem juntas e o desejo ou disponibilidade de abrir mão de (quase) tudo para fazê-lo, talvez uma abordagem diferente possa ter causado estranheza e levado à interpretação de que não haveria muito futuro num encontro em que as coisas aconteçam mais tranquilamente. E pode um encontro assim, mais tranquilo, levar a algum lugar? E permitir a criação de um relacionamento baseado na amizade e na confiança, no interesse mútuo e no desejo de construir algo juntos, sem passar necessariamente pelo apaixonamento intenso? Ou será que escolhi essa abordagem apenas para me preservar da questão de revelar meu status sorológico logo de cara? Enfim, muito para se refletir e me preparar para o próximo encontro.
Não sei nem nunca vou saber as respostas, nem mesmo se minha indiferença é uma defesa ou se realmente não havia muito leite para se espremer daquela pedra.